Carma, destino ou maldição?
O edifício do antigo Sanatório dos Caminhos-de-ferro está localizado nas Penhas da Saúde, a cinco quilómetros da Covilhã, a cerca de 950 metros de altitude, num local denominado por Porta dos Hermínios. Trata-se de uma varanda com vistas de extraordinária amplitude, onde se vislumbra toda a Cova da Beira, desde Belmonte ao Fundão e, para oriente, a Serra da Malcata e serranias espanholas.
Foto exterior do Sanatório tirada nos anos 80
Projectado pelo arquitecto Cottinelli Telmo nos anos 20,foi mandado construir pelos Caminhos de Ferro para tratamento de Tuberculose dos seus funcionários, visto poderem beneficiar da localização em sitio calmo e dos ares da Serra, fazendo parte da rede de 11 sanatórios, existentes no inicio do século XX.
Demorou 8 anos a ser construído (1928-1936) e permaneceu fechado durante outros tantos anos, devido a circunstâncias diversas e estranhas à CP. Depois viria a ser arrendado à Sociedade Portuguesa de Sanatórios, com a condição de receber todos os doentes necessitados de tratamento de altitude, tendo cinquenta camas à disposição da Assistência Nacional aos Tuberculosos.
O edifício acolheu, ao longo de mais de 40 anos, muitos milhares de tuberculosos, provenientes de todo o país, que procuravam recuperar da Tuberculose nos bons ares da Serra da Estrela.
Apesar de acolher doentes de todas as classes sociais, os doentes menos favorecidos não tenham acesso a todas as alas, algumas destinadas apenas às classes altas, que ali encontravam todo o conforto que o dinheiro podia comprar.
Oito anos após a cedência, o edifício passou para as mãos do Estado, tomando conta dele o Instituto de Assistência Nacional de Tuberculose (IANT), passando também a partir de 1953, a ser internados doentes pobres.
O recurso à quimioterapia antituberculose, levou ao encerramento dos sanatórios afastados dos centros urbanos e pouco rentáveis. E o Sanatório das Penhas da Saúde não mereceu diferente sorte, fechando as portas em Junho de 1969.
Em 1969, por ordem do Ministério de Saúde e Assistência seria dada ordem de encerramento. O seu ultimo director Dr. Carlos Coelho, licenciado em Medicina e Cirurgia pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, acabou por ser o ultimo testemunho do encerramentodo Sanatório.
Palco de grandes historias humanas, umas com sucesso, outras dramáticas, devido as carências na época. Portugal entrava em guerra com algumas colónias em África, que originou uma época de grande crise, pobreza e miséria,
Nos anos seguintes, houve a tentativa de aproveitar a estrutura, chamando-se Abrigo dos Hermínios com a finalidade de servir de albergue, estrutura de apoio ao alojamento na Serra da Estrela, tendo sido mesmo mudadas todas as camas do edifício.Após o 25 de Abril, e devido à falta de alojamento, serviu de residência temporária aos retornados e refugiados das antigas colónias.
Desde os anos 80 que foi deixado a um abandono profundo, que tem originado o seu estado de degradação até aos nossos dias.
Avaliada entre cem e cento e cinquenta milhões de euros, a reconstrução do Sanatório ultrapassa as possibilidades da Turistrela, o que obrigou à cedência em favor da Enatur.
A 28 de Novembro de 1998, o Sanatório é vendido pela Turistrela à Enatur, pela simbólica quantia de 1 escudo. Em troca, entre outras contrapartidas, a Enatur compromete-se a reconstruir o edifício e transformá-lo numa Pousada Regional de grande qualidade.
A FUTURA ESTRUTURA
O projecto foi entregue ao conhecido arquitecto do Porto,Souto Moura, cujo arranque das primeiras obras esteve previsto para o final deste Inverno, o que não irá acontecer.
Segundo Souto Moura, a fachada original vai ser mantida, pois «está lá tudo»,e nada vai ser alterado no seu interior, assim como na altura da construção as soluções aplicadas pelo arquitecto criador foram acertadas. Exemplos são a disposição de todo o trabalho de caixaria de portas e janelas, já que o seu criador fê-lo a pensar num «Hotel para doentes».
Presságio ou não, o edifício acabará mesmo como uma unidade hoteleira, com 35 quartos duplos, 16 suites e cinco quartos familiares, que poderão ser configurados como dez quartos individuais, para além de uma suite presidencial.
A preocupação deste arquitecto em criar uma estrutura com baixos custos de manutenção pois estes custos terão muito peso no futuro da gestão da Pousada. Para isso foi pedido ao Estado do Turismo para que a exigência de instalação de ar condicionado, neste tipo de unidade com classificação de cinco estrelas, possa ser revista, já que um «edifício com paredes de dois metros de espessura não precisam de ar condicionado nenhum», palavras do responsável do projecto.
Apenas duas alterações na estrutura do edifício serão visíveis do exterior. Uma nas traseiras, prolongando a zona de cozinha e serviços e outra, logo abaixo do telhado, reabrindo os solários, quebrando o aspecto pesado do edifício. Será um regresso ao projecto original, já que o seu arquitecto foi obrigado a adulterá-lo, quando a CP lhe pediu um alargamento do sanatório. Na altura os solários foram fechados e aproveitados como quartos.
As novas estruturas da pousada, não vão interferir com o conjunto original: o parque de estacionamento, com capacidade para 50 a 60 viaturas será subterrâneo. O parque, com entrada directa para o interior do edifício, terá uma zona de armazenagem de material de Inverno e um outro corredor que ligará ao health club. Esta outra unidade será construída também no subsolo. Este health club subterrâneo é construído num acentuado desnível ali existente, em que será colocada uma parede envidraçada amovível, permitindo a partir da sauna ou da piscina, o contacto com o exterior.
Para além do edifício do sanatório em si, fazem parte do conjunto da estrutura, nas redondezas outros imóveis, como a casa do médico e as antigas casas dos funcionários. A primeira será recuperada e ficará disponível como pequena unidade de alojamento de reserva, para épocas de maior lotação ou ocasiões especiais e as restantes servirãopara os funcionários.
O exterior do edifício, à entrada da pousada, terá um pequeno lago artificial e será densamente arborizado.
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Ano de 1962
Carta enviada por um doente ao Director do Sanatório
Serzêdo, Gaia 25 de Outubro de 1962
Joaquim Rodrigues Valente, doente n° 2598, quarto rés do chão 57, vem muito respeitosamente informar Vossa Excelência, Senhor Director, que recebera um oficio com o n° 2386/D datado de 23/10/962, no qual vi tudo que Vossa Excelência me manda dizer.
Senhor Diretor, venho muito respeitosamente informar Vossa Excelência que não me posso apresentar imediatamente o que me causa um grande desgosto, mas como a minha cama não pode estar vaga tanto tempo, agradecia já que vou ter a alta, que Vossa Excelência fizer-se o favor e a esmola se informava o Senhor Director do dispensário de Vila Nova de Gaia o motivo da minha alta.
Agradecendo o favor subscrevo-me com a máxima consideração e estima.
Cumprimentos e muito obrigado por tudo.
A bem da nação
Serzêdo – Gaia 225 de Outubro de 1962
Joaquim Rodrigues Valente
Anotações escritas na carta
saiu em 10/10/962 – processa-se a alta em 25/10/962
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